Como estruturar o quadro societário da sua empresa
Introdução
Organizar o quadro societário é combinar, sem ruído, poder político (voto) e direitos econômicos (dividendos, preferência, reembolso), hoje e no futuro. Em companhias (S.A.), a lógica-padrão é: ação ordinária (ON) vota; ação preferencial (PN) privilegia o econômico e pode ter voto restrito ou inexistente, nos termos do estatuto e da lei. Em sociedades limitadas (Ltda.), o voto se mede por quotas de capital, mas o regime atual admite classes de quotas com preferências — inclusive limitar/suprimir voto — desde que o contrato social detalhe as regras. Esse arranjo jurídico, somado a acordos de voto e quóruns legais, define quem decide o quê em cada fase do negócio.
Na prática
Nas S.A., “controle” não se resume a ter “metade + 1” do capital total, mas sim a capacidade de dirigir as atividades sociais, eleger a maioria dos administradores e prevalecer nas deliberações. A regra de deliberação da assembleia é a maioria dos votos presentes, ressalvadas matérias com quórum qualificado (como alterações relevantes), que pedem ao menos 50% das ações com direito a voto, salvo estatuto mais exigente. Em termos práticos, o que realmente importa é a maioria do capital votante, e não, necessariamente, do capital total.
Daí decorre um ponto estratégico: se a companhia emite o máximo legal de PN sem voto (50% do total), um bloco que concentre apenas ON pode alcançar a maioria do votante com algo pouco acima de 25% do capital total. Ex.: com 50% do capital em PN sem voto e 50% em ON, 26% do total (integralmente ON) equivalem a 52% do votante. É um desenho legítimo (e tradicional) de engenharia societária, desde que respeitados os limites legais e as regras estatutárias. Em estruturas menos “polarizadas”, o ponto de controle tende a se aproximar de 50% + 1 das ON; e, em capital disperso, acordos de acionistas podem consolidar controle com percentuais menores.
Nas Ltda., após a Lei 14.451/2022, a régua mudou: a maioria do capital tornou-se a regra geral das deliberações (e várias matérias antes sujeitas a 3/4 migraram para >50%). Isso recalibrou o poder de controle: 50% + 1 quota passaram a aprovar o ordinário e grande parte do “estrutural”, salvo se o contrato social elevar quóruns por autonomia privada. Ainda assim, cláusulas bem-desenhadas permitem freios e contrapesos (preferências, lock-up, regras de entrada/saída e resolução de impasses).
Nota sobre Ltda.: classes de quotas e voto. O Manual de Registro da Ltda. (DREI/IN 81) admite classes de quotas que atribuam direitos econômicos e políticos distintos, inclusive suprimir/limitar voto nas quotas “preferenciais”, observados os limites da Lei 6.404 aplicados supletivamente. Havendo quotas sem voto, o próprio DREI orienta que quóruns sejam calculados sobre as quotas com voto — o que permite arquiteturas de controle análogas às das S.A. Tudo isso exige contrato social claro, para reduzir atritos registrais e contenciosos.
Governança viva com tecnologia. Nada disso funciona sem documentação e previsibilidade. É aqui que um sistema de gestão societária como o da Societário Digital faz a diferença: o quadro societário vivo mostra, em tempo real, quem tem quanto (por classe/quota), quais acordos estão em vigor e como isso impacta o voto; as listas de presença com cálculo automático do quórum evitam erros antes da assembleia; e o organograma societário dá visão clara de controladas/coligadas e cadeias de controle. Em auditorias e due diligences, essa rastreabilidade ganha tempo e reduz risco.
Conclusão
Controle é técnica + estratégia. Em S.A., o voto é a moeda central; com ON e PN bem desenhadas (e respeitando o limite legal de 50% de PN sem voto), é possível otimizar controle — inclusive na hipótese de 25% + 1 do capital total bastarem quando o bloco detém apenas ON. Em Ltda., a Lei 14.451/2022 simplificou quóruns, e o contrato social pode modular preferências e voto via classes de quotas, desde que com clareza e coerência. O passo seguinte é digitalizar a governança: manter cap table/quadro societário, organogramas e quóruns vivos e confiáveis não é luxo, é blindagem jurídica e operacional.
Referências (fontes oficiais e confiáveis)
- Lei 6.404/1976 (Lei das S.A.) — art. 110 (1 ação = 1 voto), art. 116 (conceito de controle), art. 129 (maioria dos votos presentes), art. 136 (quóruns qualificados), art. 15, §2º (limite de 50% para PN sem voto ou com voto restrito). Planalto/Câmara/CVM. Sistemas CVMJusBrasil+1Palácio do Planalto
- Lei 14.451/2022 — altera arts. 1.061 e 1.076 do CC, reduzindo quóruns em Ltda. (maioria do capital). Senado (notícia oficial) e análise técnica. Senado FederalMattos Filhos
- DREI – Manual da Ltda. (IN 81/2020, Anexo IV) — classes de quotas, inclusive preferenciais com limitação/supressão de voto; orientação sobre cálculo de quóruns considerando apenas quotas com voto. Gov.br (PDF). Serviços e Informações do Brasil+1
- Doutrina/Análise — controle com PN sem voto no limite e reflexos do voto plural (contexto histórico). Migalhas.
Perguntas Frequentes (FAQ)
Não. Essa hipótese só se sustenta quando 50% do capital está em PN sem voto (limite legal) e o bloco controlador detém apenas ON, alcançando >50% do capital votante. Em composições diferentes (PN com voto eventual, dispersão, estatuto mais rígido), o ponto de controle muda.
PN pode votar em situações previstas na lei/estatuto (ex.: falta de pagamento de dividendo mínimo no prazo). O padrão, porém, é restrição ou ausência de voto, dentro dos limites legais.
Em muitos temas, não mais: boa parte das matérias relevantes migrou para maioria do capital (>50%). O contrato social ainda pode elevar quóruns, mas, como regra, 50% + 1 passaram a aprovar o essencial.
Sim, de acordo com o DREI/IN 81, desde que o contrato social descreva as preferências e a limitação/supressão de voto, observando supletivamente os limites da Lei das S.A. (como o teto de 50% para títulos sem voto). Isso viabiliza arranjos de controle semelhantes aos de companhias.
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