Distribuição Desproporcional de Dividendos em S/A: Quando é Permitido e Quais os Riscos?
A distribuição de dividendos é um dos temas mais sensíveis na governança de uma sociedade anônima, especialmente quando foge da regra da proporcionalidade. Embora o modelo padrão da Lei das S.A. (Lei nº 6.404/76) seja a repartição proporcional ao número de ações, existem hipóteses — legais e estratégicas — que admitem a distribuição desproporcional de dividendos.
Neste artigo, vamos explorar:
- O que a lei permite;
- Quando há risco tributário ou societário;
- O que dizem a doutrina e a jurisprudência;
- Como se proteger com governança e documentação adequada.
A Regra da Proporcionalidade na Lei das S.A.
O que diz a Lei
O art. 202 da LSA prevê que os dividendos devem ser atribuídos proporcionalmente à participação no capital social, salvo previsão estatutária em contrário.
- Ações ordinárias: direito igual por ação.
- Ações preferenciais: podem receber dividendos fixos ou mínimos (art. 17 da LSA).
Essa proporcionalidade garante previsibilidade e isonomia entre acionistas e é considerada uma regra de ordem pública, sendo sua flexibilização tratada com cautela pelos tribunais.
Fundamento jurídico:
- Art. 202, caput e §1º, Lei 6.404/76
- Art. 17, §1º, Lei 6.404/76 (preferência nos dividendos)
Quando a Desproporcionalidade é Permitida
Com previsão estatutária
A distribuição desigual entre acionistas é possível quando prevista no estatuto e devidamente aprovada pela assembleia geral.
Exemplos:
- Dividendos fixos para preferencialistas;
- Acordos entre sócios com cláusulas de remuneração diferenciada;
- Pactos parassociais com objetivos claros (ex: recompensa por know-how).
Sociedades Anônimas enquadradas na LC 182/2021
Para S/As com receita inferior a R$ 78 milhões/ano, o Marco Legal das Startups (LC 182/21) permite que a assembleia delibere sobre dividendos desproporcionais mesmo sem cláusula estatutária específica, conforme art. 294, §4º da LSA.
💬 "A assembleia geral poderá deliberar sobre a distribuição de dividendos em percentuais diversos, observadas as preferências e vantagens estatutárias." (Art. 294, §4º, LSA)
Os Riscos Envolvidos na Distribuição Desproporcional
Risco societário: questionamento por abuso de poder
A desproporcionalidade sem base estatutária ou sem justificativa econômica pode ser entendida como violação aos deveres fiduciários dos administradores (art. 154, LSA) e como abuso do poder de controle (art. 117, LSA).
Exemplo prático:
Se sócios majoritários recebem dividendos desproporcionais sistematicamente, minoritários podem judicializar o caso sob argumento de abuso ou enriquecimento ilícito.
Risco tributário: caracterização como doação
A Receita Federal pode requalificar dividendos desiguais como doação entre sócios, sujeita à tributação pelo ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação).
- Jurisprudência do CARF: exige motivação clara e suporte contábil.
- Reformas em curso (PLP 108/24): buscam tributar distribuição “disfarçada” de patrimônio como doação.
Como Justificar a Desproporcionalidade
Para ser válida, a distribuição desproporcional deve ter motivação econômica clara e estar documentada. Alguns exemplos aceitos:
- Compensação por aportes que não foram formalizados como aumento de capital;
- Remuneração por know-how, uso de marca ou estrutura do acionista;
- Cláusulas de acordos de acionistas devidamente registrados;
- Previsão de dividendos fixos para ações preferenciais;
- Compensações previstas para manter sócios estratégicos na empresa.
Recomendação: documente em ata a justificativa da distribuição, mesmo que haja consenso entre os sócios. Isso evita litígios futuros e dá segurança à administração.
Boas Práticas de Governança e Controle
- Prever expressamente a possibilidade no estatuto ou acordo de acionistas.
- Realizar deliberações formais com base em demonstrações financeiras auditáveis.
- Registrar justificativas contábeis e negociais na ata da assembleia.
- Evitar repetições sistemáticas sem previsão contratual.
- Monitorar impactos sobre a relação entre minoritários e controladores.
- Utilizar uma plataforma digital para manter histórico de deliberações e alertas de compliance (como a Societário Digital).
Conclusão
A distribuição desproporcional de dividendos é permitida em certos contextos, mas exige respaldo jurídico, contábil e contratual. Quando mal executada, pode gerar:
- litígios societários;
- sanções administrativas;
- e até impactos tributários severos.
Empresas que adotam boas práticas de governança e registro digital têm mais segurança para explorar essa flexibilização estratégica sem comprometer a integridade do processo decisório.
Perguntas Frequentes (FAQ)
Apenas se a empresa for uma S/A de pequeno porte (LC 182/21) e houver aprovação da assembleia. Do contrário, é arriscado.
Sim, principalmente se a distribuição for muito desproporcional, sem cláusula estatutária ou justificativa clara.
Se o acordo estiver formalizado, registrado na sede da companhia e respeitar os limites legais, a desproporcionalidade será válida.
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